Número total de visualizações de páginas

domingo, 15 de setembro de 2013

O Lechá Dodi do Rabino Alkabetz









O Lechá Dodi é o ponto alto do Cabalat Shabat – o serviço de orações das noites de sexta-feira, quando recebemos o Shabat. De todas as orações desse dia, o Lechá Dodi é a mais famosa e bela, e nenhuma outra é recitada com tanto júbilo e fervor. Escrita pelo poeta e cabalista sefardita do século XVI, o Rabino Shlomo HaLevi Alkabetz, o Lechá Dodi foi adoptado por todas as comunidades judaicas, sefarditas e asquenazitas. Pouco se sabe sobre Rabino Alkabetz, que nasceu por volta de 1505, até que ele se estabeleceu na cidade de Salônica, onde se tornou extremamente respeitado por seus profundos conhecimentos da Torah, Talmud e das obras místicas. Em meados de 1535, após viver com o Rabino Yossef Caro, autor do Shulchan Aruch, uma experiência mística, deixou essa cidade e fixou residência em Safed. A cidade era um grande centro de estudos místicos, onde viviam e ensinavam grandes sábios sefarditas, profundos conhecedores do Talmud e da Cabala, como Rabino Moshe Cordovero, Rabino Chaim Vital e o próprio Arizal, Rabino Itzahak Luria, o maior cabalista na história judaica.
Em Safed, às sextas-feiras, ao pôr-do-­sol, Rabino Alkabetz ia com outros cabalistas aos campos, para dar as boas-vindas ao Shabat. Foi nessa atmosfe­ra que Rabino Alkabetz escreveu a po­ema Lechá Dodi. Apesar de outras saudações poéticas ao Shabat terem sido compostas por outros sábios, foi o Lechá Dodi que recebeu o endosso de Rabino Yitzhak Luria, discípulo do cabalista Rabino Cordovero, aluno e cunhado de Rabino Alkabetz.





Tendo sido composto por um homem que foi um grande erudito em Torah, cabalista e poeta, o Lechá Dodi tem muitas camadas de significado. Baseia-se em fontes encontradas nos Cinco Livros da Torah, nos Livros dos Profetas e nas Escrituras Sagradas, no Talmud e Midrash, e faz referências a alguns dos assuntos mais profundos e complexos da Cabala. Mas como a interpretação cabalista de seus versos está além do escopo deste ensaio, elucidaremos o significado básico das estrofes do Lechá Dodi, para que cada um de nós possa ter condições de melhor apreciar suas palavras quando as recitamos durante as orações da noite de Shabat.
O tema geral do Lechá Dodi é que o Shabat é uma “Noiva” ou uma “Rainha”, a quem saímos para receber e dar as boas vindas. Estas metáforas se baseiam na descrição do Talmud sobre a alegre saudação dos Sábios ao Shabat (Shabat, 119a): Rabino Chanina costumava envolver-se em suas vestes especiais do Shabat e dizer: ‘Vamos, saiamos para saudar a Rainha do Shabat’ ”. Rabino Yannai se aparamentava com suas vestimentas especiais e dizia: “Entre, noiva! Entre, noiva!”. O Lechá Dodi divide-se em estrofes. Algumas congregações têm o costume de repetir a primeira estrofe (Lechá Dodi Likrat Kala, Penei Shabat Necabelá) após recitar cada uma das demais estrofes. Abaixo traduzimos e elucidamos cada estrofe individualmente.



Lechá Dodi:



“Vem, meu Amado, saudar a Noiva, vem, vamos dar as boas vindas à Presença do Shabat.”
Lechá Dodi se inicia convidando nosso “Amado”, o Próprio D’us, a se unir a nós no Shabat. A “Noiva” é o próprio Shabat. O Midrash (Bereshit Rabá 11) ensina que quando D’us criou o tempo, dividindo-o em sete dias, Ele prometeu ao recém-criado Shabat que “Israel será seu novo par” para sempre. Consequentemente, a cada semana, o povo judeu saúda a aproximação do Shabat como se fosse um noivo que aguarda sua noiva, enquanto esta se aproxima do pálio nupcial.






E numa outra versão...






Outro comentarista (Anat Yosef) interpreta a “Noiva” como sendo uma alusão à Shechinah, a presença explícita de D’us, que foi retirada do homem devido aos pecados de Israel. Por isso, pedimos ao Eterno que se una a nós ao saudar Sua própria presença; estamos orando a Ele pelo fim do exílio, para que a Shechinah volte novamente a brilhar sobre o povo judeu e sobre o mundo todo. Isto somente ocorrerá com a chegada do Mashiach e a reconstrução do Templo Sagrado de Jerusalém.







Pintura de Shirley Horwich




Shemor:



“Guarda e Recorda, ditos em uma expressão única e simultânea, nos fez ouvir D’us, Uno e Único. O Eterno é Um e Seu Nome é Único – por seu bom nome, por sua beleza, por seu louvor.”
O Talmud (Shevuot 20b) ensina que quando D’us deu os Dez Mandamentos, Ele milagrosamente habilitou Israel a ouvir simultâneamente os dois aspectos complementares do mandamento do Shabat: Shemor (Deuteronômio, 5:12) – para guardar o Shabat – é a ordem de evitar sua profanação, ao passo que Zachor (Êxodo, 20:8) – para recordar o Shabat – é a ordem de realizar os mandamentos positivos associados a esse dia, tais como recitar o Kidush sobre um copo de vinho e dedicar o dia a actividades que são permitidas, espiritualmente elevadas e fisicamente alegres, tais como a oração, o estudo da Torah, o descanso e o prazer das refeições do Shabat. Apesar de a Torah escrever esses dois mandamentos, Shemor e Zachor, de forma separada, D’us os combinou no Sinai para que o povo judeu entendesse que os mesmos são inseparáveis.





Um dos comentários sobre o Sefer Yetzirá (o Livro da Formação), o livro mais antigo sobre a Cabala, afirma que a capacidade de D’us de fundir os opostos é indicada pela descrição d’Ele como sendo “Um e Único”. O Infinito Criador, que não é limitado de forma alguma, realiza o feito impossível de pronunciar as palavras “Recorda” e “Guarda” de forma simultânea.






Via: Revista Morashá e Cultura Judaica blogspot