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domingo, 2 de dezembro de 2012

Judiarias de cá...



Foi em janeiro deste ano, que levei a cabo com a família uma visita por algumas judiarias no centro e norte do país, tirando apontamentos e completando o tour com as indespensáveis fotos. Foram três dias a calcorrear estradas, ruas e montes, em suma, conhecer in loco um património único e rico de tradições e cultura.


Sinagoga de Belmonte




Sinagoga “Beit Eliahu” (Casa de Elias)


Foi no ano de 1989 que a comunidade é reconhecida oficialmente e em 1996 inaugura a sinagoga “Beit Eliahu” (Filho de Elias) no exacto local de uma das antigas ruas da velha judiaria. Também o cemitério judaico foi aberto em 2001. Desde 2005 está igualmente aberto ao público o Museu Judaico  que retrata a história da presença sefardita em Portugal.



Guarda


Integrada no povoamento judaico da raia portuguesa está a região da Beira Interior. Nela nasceram algumas comunas que criaram em seu redor judiarias suas satélites. Estas reduziram-se a uma rua onde habitavam judeus mas não possuíam autonomia comunal, ou seja, não possuíam magistrados próprios. Na sua grande generalidade a origem da maior parte destas pequenas judiarias remonta ao grande surto de povoamento judeu, datável dos fins do século XIV e da centúria seguinte. A comuna de judeus mais antiga é a da Guarda. A documentação fá-la remontar, pelo menos, ao séc. XIII, pois D. Dinis afora as casas régias da freguesia de S. Vicente a famílias judaicas e instala numa delas a sinagoga. É a judiaria nova, prolongamento de uma anterior, a judiaria velha o que nos faz supor a sua anterioridade ao tempo de D. Afonso III ou até mais cedo. É a judiaria que principia próximo da Porta d`EL Rei e termina junto ao Adro da Igreja de S. Vicente, tal como ainda hoje persiste na memória toponímica da cidade. Os judeus estenderam-se pela rua que corre dos açougues para o paço real e pelas travessas adjacentes à muralha da cidade e pela rua direita que termina na Porta d`EL Rei.











 Judiaria da Guarda


O encerramento do bairro judaico foi tardio, talvez da segunda metade do século XV. Em 1465, fechou-se a saída da judiaria para o Adro de S. Vicente, devidos aos protestos dos cristãos e, em 1475, um contrato de aforamento referia o "çarramento da judiaria que ora se faz". Nela residiram famílias judaicas como os Ergas, Pernica, Castro, Falilho, Tobi, Querido, etc.
Em finais do séc. XIV, pela inquirição feita neste concelho por ordem de D. João I, sabemos que residiam na judiaria cerca de 40 famílias, ou seja, cerca de 200 indivíduos de credo moisaico. Em meados da centúria, o seu número triplicara, reflectindo assim a mobilidade judaica no interior da Península. A população rondava então entre 600 a 850 pessoas, que na sua maioria, se dedicavam aos ofícios. De facto, em meados do séc. XV residiam naquele local e tinham permissão para contratar na sua arte 31 sapateiros, 6 ferreiros, 5 tecelões, 4 alfaiates e gibiteiros, 1 tosador. Havia ainda 3 mercadores e 1 físico. conhece-se ainda o nome de 3 rabis, tendo os 2 últimos o nome de José. Talvez se tenha passado com o último, chamado José Oça, o episódio em que o rabi matou os seus quatro filhos para evitar a sua educação cristã, de acordo com a ordem régia.
Na época da expansão marítima, a judiaria da Guarda, uma das mais abastadas graças ao labor artesanal e mercantil dos seus membros, foi das mais causticadas e das que mais contribuíram para o espírito de cruzada das expedições e também para a defesa do Reino. Infelizmente, a fanática pressão dos reis católicos junto de D. Manuel I levaram-no a decretar a expulsão ou conversão forçada dos judeus, em 1496.











Marcas cruciformes gravadas dentro da área urbana da judiaria


Actualmente a Guarda conserva ainda um bairro que mantém o aspecto geral da judiaria, os seus arruamentos e casas, não obstante de ter sofrido alterações, principalmente nos últimos decénios. Desde o repovoamento de D. Sancho I até à expulsão e conversão forçada, (1496), sempre aqui houve judeus. Sabemo-lo pelo foral sanchino, pelos Costumes e pelo foral novo de D. Manuel I, de 1 de Junho de 1510.


As casas da judiaria são baixas, térreas ou de um só andar. As casas sobradadas da gente do Povo eram raras até ao séc. XIV, multiplicando-se a partir de então. As moradias dos mercadores apresentam, normalmente, uma porta estreita e uma porta larga. Esta abria para a loja, isto é para o estabelecimento comercial. A estreita dava entrada para as escadas, que conduziam à residência assoalhada sobre a loja de comércio. Curiosamente, muitas destas casas têm as ombreiras e torsa trabalhadas em bisel, quer na porta de entrada da habitação, quer na do comercio. O largo da judiaria, apesar das adulterações, é um dos recantos mais castiços da Guarda primitiva, na modéstia dos seus edifícios. O comércio e o desenvolvimento agrícola incrementado ao longo dos séc. XVI e XVII, modificaram o ruralismo introduzindo na Guarda a arquitectura pesada quinhentista a que se seguiu a filipina, com cornijas salientes, gargulas de canhão, pátios e amplas salas. Havia ainda um arrai-menor, o qual, entre outras funções, determinava os tributos que deveriam pagar os judeus daquela comarca, o que por vezes levantava protestos, como aconteceu no tempos de D. Afonso IV. Os judeus tinham sinagoga. Inicialmente funcionou num edifício alugado. Depois, construíram-na.

A judiaria tinha a entrada principal às Quatro Quinas, local onde confluem três ruas que se cruzam e foram quatro esquinas de rua. A mais longa dessas artérias comunica com a Porta de El Rei, uma das entradas da cidades. Esta porta fica a alguns metros das Quatro Quinas, e da entrada da judiaria. Hoje está assinalada por uma placa de mármore colocada em 1980 pela Associação de Amizade Portugal - Israel. A antiga Rua Nova da Judiaria tem o nome de Rua do Amparo. Do lado direito desta entrada, vê-se emparedada a porta da Casa da Guarda. Onde o Porteiro fazia o controlo e abria ou fechava o acesso. A Casa da Guarda é um edifício que conserva as características medievais e poderá datar do séc. XIV. A obrigação dos judeus da Guarda respeitarem o regulamento das horas de recolha não deve ter tido de longa duração, pois sabemos que cedo começaram a ter casas junto das dos cristãos. a judiaria, como bairro isolado não era uma forma de discriminação, mas sim de protecção à privacidade exigida pelos próprios judeus. A judiaria, de que a Rua do Amparo e anexas são documento, estava isolada do resto da cidade e o seu acesso só era possível fazer-se por duas ruas. O uso de distintivo próprio, a estrela amarela de David, nunca conseguiu ser imposto com êxito aos judeus portugueses, embora nas Cortes os reis fossem advertidos com relativa frequência de que deveriam por em prática estas medidas legislativas. Em 20 de Fevereiro de 1391, nas Cortes de Évora, D. João I foi coagido a promulgar uma lei que ordenava que todos os judeus, usassem emblemas avermelhados hexagonais, do tamanho do seu grande régio, aplicados nas vestes exteriores "acima da boca do estômago". Quem não obedecesse poderia perder a roupa ou ser preso durante 15 dias. Estas disposições estão incertas nas Ordenações Afonsinhas mas apesar disso, o sinal discriminatório não foi usado. Outras proibições não surtiram efeitos executórios. Foi o caso, por exemplo, da legislação criada por D. Duarte, sobre influencia da castelhana, que proibia que os judeus empregassem cristãos, ou cristãs, como trabalhadores, pastores ou criados. Aos judeus era interdito negociar com mulheres à porta de casa. Só o podiam fazer na via pública. Mas havia certas profissões em que tal era permitido: a dos médicos, cirurgiões, alfaiates, pedreiros, marceneiros e carpinteiros, aos quais era permitido penetrar em casas cristãs desde que acompanhados por dois homens, ou duas mulheres cristãs. Os judeus que mercadejavam nas aldeias ou compravam mel nas quintas, cera, peles de coelho e de borrego, etc., além dos outros vendedores ambulantes, podiam entrar em casas cristãs, onde houvesse mais do que uma mulher. era vedado às mulheres cristãs que não fossem acompanhadas de um homem cristão barbado entrar nas lojas dos judeus para fazer compras ou vendas. Era vedado às mulheres cristãs, sob pena de morte, entrar na judiaria, ou manter relações ilícitas com os judeus. Era proibido aos judeus beber vinho nas tabernas dos cristãos quando houvesse taberna judia. Os judeus pagavam, um tributo especial, a juderega ou judenga, fixado em trinta dinheiros, per capita. Este sistema recorda os trinta denários (dinheiros) porque foi vendido Cristo.





Na tradição e na alma da gente da Guarda conserva-se a memoria da presença judaica. As famílias tradicionais da cidade não poderão negar uma ascendência hebraica operada depois do séc. XVI, através dos matrimónios de cristãos-novos...




Sabugal


A presença de uma comunidade judaica no Sabugal está documentada (pelo menos) desde o início do século XIV. Os reconhecidos estudos medievais da historiadora Maria José Ferro Tavares incluem a comuna judaica do Sabugal entre as três dezenas que identificou para o período de 1279-1383, tendo confirmado documentalmente a sua existência em 1316, através de uma dívida dos judeus do Sabugal ao rei D. Dinis em 16 de Agosto desse ano.





 






Marcas na judiaria de Sabugal




Hechal clandestino situado na Casa do Castelo




 Fotos de Rafael Baptista, Manuela Videira e Carlos Baptista


             www.turismo.guarda.pt