Como já em anteriores posts salientei, Trás-os-Montes
tem até hoje um incontável registo de tradições que ficaram da herança judaica, o
jogo do Rapa parece ser um desses exemplos.
Fernando Ribeiro no seu blogue dedicado à cidade de
Chaves, relata-nos sobre este mesmo jogo, praticado até hoje em algumas zonas
transmontanas, mas ao que indaguei, este costume foi também utilizado pelas crianças
da Beira-Alta, que em tempos mais difíceis, era acompanhado com pinhões,
castanhas e outros frutos secos.
(…) O Natal de muitos dos nossos pais e avós foi
marcado por um jogo que está bem presente nas suas memórias de infância. Rapa,
tira, deixa e põe...
O jogo do
rapa. Deixem, agora, que mude o nome a este brinquedo e lhe chame dreidel, em
yiddish, e passe a ler as quatro letras em hebraico - נ
(Nun), ג
(Gimel), ה (Hei), ש
(Shin), que juntas foram o acrónimo para (Nes Gadol Haya Sham – “um grande
milagre aconteceu lá” – em Israel).
O rapa. Um brinquedo e um jogo que a diáspora
judaica manteve durante as festividades do Hanukah, para consagrar e honrar a
memória da Terra Santa. Um jogo que nós adaptámos e baptizámos com a devida
vénia à tradição anti-judaica: rapa, tira...
Vem-me
ainda à memória a curiosa tradição de Páscoa que, na minha adolescência, vim
encontrar em Chaves. Em vésperas da Semana Santa juntava-se dinheiro para
comprar peças de barro no antigo mercado da Rua do Olival. No domingo de
Páscoa, na Rua de Santa Maria, as crianças jogavam aos púcaros e caçoilos,
atirando-os de mão em mão até se partirem... Mais tarde, Amílcar Paulo [n.
1929], ensinou-me que a tradição sefardita cripto-judaica mantinha o hábito de
quebrar loiça doméstica, durante a Páscoa, como símbolo de renascimento e
renovação...
Recordo,
para concluir, as reticências que algumas pessoas tiveram perante o nome
escolhido para a minha filha. Embora não aceitando as objecções, compreendi-as.
Há uma quadra popular que evidencia ainda o preconceito dos católicos para com
este e outros nomes:
Ana, Magana,
Rebeca, Susana,
Pariste um gato
Debaixo da cama...
Surge como
inevitável a associação das expressões aqui há gato e sabe a rabo de gato com
esta quadra, mesmo que as suas origens possam ser outras... Se, entretanto,
considerarmos que a antiga judiaria de Chaves ainda não foi definitivamente
localizada e à tradição oral acrescentarmos um pouco de imaginação, veja-se
onde a Rua dos Gatos nos pode levar..."
(Um grande obrigado à Cristina Oliveira, que foi a
pessoa que me fez chegar este tema).
Via: chaves.blogs.sapo.pt