"Sendo a nossa alma imagem pintada da suma beleza e desejando naturalmente voltar à própria divindade, está sempre grávida dela por natural desejo; por isso, quando vê uma pessoa de per si bela duma beleza que se lhe ajusta, reconhece nela e por ela a beleza divina, porque também aquela pessoa é imagem da divina beleza. Com a sua beleza, a imagem daquela pessoa amada aviva na mente do amante, aquela beleza divina que está latente na mesma alma e dá-lhe actualidade do mesmo modo como lha daria a própria beleza divina exemplar..."
Leão Hebreu (Judah Abravanel) (1465 - 1534?), "Diálogos de Amor", Roma, 1535.
Leão Hebreu
Filósofo português, de seu nome Judah Abravanel, filho do Rabino e conselheiro de D. Afonso V, Isaac Abravanel, Judá nasceu em 1465 em Lisboa, e morreu em 1535 em Itália. Estudou o Talmude, a Cabala e a filosofia clássica hebraica, latina e muçulmana, e formou-se em medicina. Filósofo marcado pelo espírito renascentista, de tendência sincrética, tentou mostrar o acordo da Bíblia com a filosofia grega. A sua obra principal, Diálogos de Amor, é um diálogo entre dois amantes: Fílon - o amor - e Sofia - a sabedoria. Aí expõe a sua doutrina, segundo a qual o amor é o fundamento ontológico do real, concebido não apenas como sentimental, mas também como intelectual: deste modo pretende unificar fé e razão, embora deixando clara a prevalência da primeira.
Pelo amor Deus criou e pelo amor a criatura regressa a Deus. É, então, o amor que a tudo anima e a tudo harmoniza. Neste sentido, Leão Hebreu defende uma concepção cosmológica que, à maneira neoplatónica, estabelece uma hierarquia de seres que vai do puro espírito - Deus - à matéria. O mundo é visto como um ser vivo composto de superior e inferior, respectivamente, alma e corpo.
O regresso do homem a Deus realiza-se pelo amor na medida em que este é um amor intelectual; daqui se depreende a função escatológica do conhecimento na sua doutrina.
Fonte: Infopédia - Porto: Porto Editora, 2003-2012